domingo, 14 de maio de 2017

“Sentinelas da madrugada”

Foto retirada daqui
O Papa Francisco veio a Fátima recordar que “temos Mãe!”

Repetiu-o três vezes na homilia da missa de ontem, que celebrou os cem anos das aparições. Uma mãe misericordiosa e “bendita por ter acreditado”, não alguém que segura o “braço justiceiro de Deus pronto a castigar”, ou uma “Santinha a quem se recorre para obter favores a baixo preço”, como tinha esclarecido na noite anterior, depois da bênção das velas e antes da oração do Rosário. Mais uma vez, o Papa preferiu sublinhar a misericórdia e não o juízo ou a condenação.

Terminou a homilia a desafiar os fiéis a não serem “uma esperança abortada”, mas a converterem-se, “sob a proteção de Maria”, em “sentinelas da madrugada”. Exortou-os a saber “contemplar o verdadeiro rosto de Jesus Salvador, aquele que brilha na Páscoa, e descobrir novamente o rosto jovem e belo da Igreja, que brilha quando é missionária, acolhedora, livre, fiel, pobre de meios e rica no amor”.

Com as suas palavras o Papa deu um contributo extraordinário para ajudar os crentes a melhor entenderem o papel da Virgem Maria nas suas vidas, bem como a forma como se devem relacionar com ela. Não o fez com uma linguagem hermética e complicada, como tantas vezes acontece em contextos eclesiais, mas com o recurso a uma linguagem que todos compreendem, mesmo arriscando-se a escandalizar alguns que preferem as conceções marianas que ele criticou.

Compete à Igreja, sobretudo a portuguesa, dar agora continuidade ao percurso que o Papa iniciou na Cova da Iria. Levar as pessoas a viverem uma espiritualidade mariana ajustada ao Evangelho e, por isso, mais sadia. A Igreja deve tornar-se mais luminosa, com uma pulsação mais jovem e um renovado ardor missionário. E – ponto muito importante – não deve ter receio de empobrecer, desde que seja para se tornar muito mais rica em caridade.

(Texto publicado no Jornal de Notícias de 13/05/2017)

sábado, 13 de maio de 2017

Papa Francisco: Peregrino da Paz

Foto retirada daqui
Passaram cem anos e muitas das questões que se colocaram quando as três crianças disseram que viram a Nossa Senhora continuam por responder. Ao longo de um século, o Santuário de Fátima — com diversas iniciativas, como os congressos marianos — tem procurado encontrar respostas para muitas das dúvidas e críticas que têm sido feitas às aparições.

Nos últimos meses reacenderam-se polémicas e trocaram-se argumentos. Começou-se logo pela designação mais correta dos acontecimentos, se aparições ou visões. Se as crianças tiveram uma experiência mística e digna de fé, como defende a Igreja, ou se tudo não passou de um aproveitamento para reforçar o papel da Igreja num período em que ela era muito contestada, e perseguida.

São debates interessantes, que devem continuar depois da celebração do centenário para um melhor conhecimento da mensagem de Fátima e seu aprofundamento. E até para a correção de algumas interpretações erróneas. Essa discussão, contudo, passa ao lado dos peregrinos que rumam à Cova da Iria com as mais diversas motivações, como não se têm cansado de mostrar todos os meios de comunicação presentes no acompanhamento e chegada dos peregrinos ao Santuário.

O Papa Francisco fez questão de sublinhar que vem como peregrino. Afirmou-o tanto na mensagem que dirigiu aos portugueses, como na primeira oração na Capelinha das Aparições. Extraordinário é que tenha assumido igualmente a condição de pecador, o qual caminha em sintonia com tantos outros que reconhecem em si essa mesma condição.

Vem como peregrino da paz preocupado com esta “terceira guerra mundial aos pedaços”. Ergue a sua voz para denunciar os muros que estão a ser construídos, num mundo que precisa, como nunca, de pontes que congreguem.

O Papa Francisco, embora não seja essa a sua principal preocupação, poderá ajudar a compreender melhor a Mensagem de Fátima — e também a actualizá-la, a usá-la como resposta ao contexto que o mundo vive neste início do terceiro milénio. Pode ser que não resolva questões com cem anos, mas contribuirá decerto para a forma como Fátima será interpretada nos próximos anos.

(Texto publicado no Jornal de Notícias de 12/05/2017)